sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Representação

EXCELENTÍSSIMO SENHOR CHEFE DA PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA DA 5ª REGIÃO.









O MOVIMETO SOCIAL CONTRA A CRIMINALIDADE EM ALAGOAS, composto pelas entidades abaixo assinadas, tendo em vista os fatos trazidos à baila pela operação policial denominada “Taturana” cujo escopo é investigar o desvio de verba na Assembléia Legislativa de Alagoas, vêm à presença de Vossa Excelência propor a presente


R E P R E S E N T A Ç Ã O


Com base nos artigos 1º a 3º, 5º, 6º, 23, II, 37, parágrafo 6o, 127 a 129, 196 a 198 da Constituição Federal para que o Ministério Público Federal tome as providências necessárias visando ao afastamento de toda a Mesa Diretora da Assembléia Legislativa até que se conclua a investigação criminal, à luz dos fatos e fundamentos a seguir delineados.


1. S I N O P S E F Á T I C A

Nos últimos meses, o Estado de Alagoas recebeu mais uma operação da Polícia Federal, codinominada de “Operação Taturana”. As investigações deslindaram que, em cinco anos, foram desviados cerca de R$ 200 milhões da Assembléia Legislativa. Como conseqüência dessas investigações, até o momento, foram indiciados o presidente da Mesa Diretora da Assembléia, Antônio Albuquerque e outros quatro deputados que compõem a mesa diretora - Dudu Albuquerque, Cícero Amélio, Nelito Gomes e Edval Gaia Filho.
Além deles, foram indiciados também os deputados Cícero Ferro, Arthur Lira, Isnaldo Bulhões e Maurício Tavares. O inquérito traz fatos que envolvem os deputados, além de empresários, ex-parlamentares e funcionários de bancos detidos na operação, a crimes como peculato, formação de quadrilha, crime contra a ordem tributária, crime contra o sistema financeiro nacional e lavagem de dinheiro.
À vista desse fato, formulou-se requerimento em que se pleiteava afastamento da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa até o fim das investigações da Operação Taturana. Entrementes, tal pleito fora desacolhido pelo Plenário da Assembléia Legislativa e, à fundamentação de “conflito de informações” e por estar, segundo esse órgão, em desacordo com o Regimento Interno do Legislativo e com a Constituição Federal, o requerimento de afastamento da Mesa Diretora acabou sendo arquivado.


2. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA PRESENTE REPRESENTAÇÃO


2.1. Da Preservação da Neutralidade da Investigação Criminal

A primeira altercação a qual submetemos ao crivo de Vossa Excelência diz respeito ao comprometimento da atual Mesa Diretora da Assembléia Legislativa com o(s) crime(s) apurado(s) na operação “taturana”, porquanto a Polícia Federal indiciou, além do Presidente da Mesa Diretora da Assembléia, o Deputado Antônio Albuquerque, outros quatro deputados que a compõem - Dudu Albuquerque, Cícero Amélio, Nelito Gomes e Edval Gaia Filho.
Ora, Vossa Excelência haverá de concordar que exatamente nessa medida, a manutenção dos sobreditos deputados estaduais à frente da Assembléia Legislativa poderá impor à investigação criminal percalços, uma vez que será á Mesa Diretora que se requisitarão informações, solicitarão documentos, dentre outras diligências relevantes à elucidação dos fatos consignados no inquérito policial, de tal sorte que a permanência da presente Mesa Diretora poderá perturbar a livre e equilibrada investigação criminal.
Recomenda-se, em situação como esta, que àqueles que tenham acesso a informações privilegiadas e que estejam sendo investigados – com justeza, o que temos no caso em relevo – seja pespegada a medida acautelatória de afastamento, ainda mais quando tais agentes possam influenciar nessa investigação.
Nesse sentido, confira-se proeminente lição do Promotor de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, o Dr. Alexandre Sikinowiski Saltz, nestas palavras:

[...] a medida será necessária à instrução processual quando houver a possibilidade de que o agente público - em permanecendo no cargo - possa deturpar a instrução do feito, seja pelo livre acesso que continuará tendo às provas, seja pela possibilidade de influenciar testemunhas, via de regra funcionários subalternos que, por temor, nada falarão contra seus superiores.[1]

Admitir o contrário, é o que nos parece, isto é, permitir que os investigados continuem à frente de órgão cujas informações que possam por ele serem prestadas serão de vital importância ao desenlace dos fatos contidos no inquérito, não seria razoável, à vista do evidente interesse que os deputados supracitados têm em assistir a um desfecho que lhes seja favorável, o que compromete, inteiramente, suas atuações frente à Mesa Diretora da Assembléia Legislativa.
Não se venha falar aqui em arrosto ao valoroso princípio constitucional da presunção de inocência, uma vez que tal proposição encontra guarida em nossa ordem jurídica, porquanto, mutatis mutandis, vale-se do mesmo embasamento que suscita, no campo penal, a decretação da prisão preventiva, isto é, a garantia da ordem pública, bem como na conveniência da instrução criminal.

Com efeito, Excelência, a presente medida se justifica dado o poder político que cada um dos deputados estaduais indiciados possuem, sendo possibilidade concreta a de os mesmos interferirem na marcha da investigação criminal, ainda mais se estiverem à frente da Mesa Diretora.

Esse, aliás, é entendimento presente em nossas Cortes, como, v.g., o esboçado no julgamento da MC 6239 no Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, cuja decisão restou assim ementada:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - PERDA DO OBJETO RECURSAL - INOCORRÊNCIA - LEI DE IMPROBIDADE - AFASTAMENTO DE AGENTES POLÍTICOS - POSSIBILIDADE - INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO DE PISO - INOCORRÊNCIA - NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.
1) Não há que se falar em perda do objeto recursal, vez que o afastamento dos agentes políticos de seus mandatos deu-se em virtude de possíveis óbices que estes poderiam causar à instrução processual, não possuindo a presente medida, relação com a votação da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Espírito Santo.
2) Pela análise da Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), tem-se a possibilidade de afastamento de agente público que exerça mandato eletivo, conforme interpretação dos art. 20 e 2º da referida lei, que encontra respaldo, inclusive, em posicionamentos do STJ.
3) O simples indeferimento de liminar nos autos da medida cautelar na ADIN nº 2.797, que pretende suspender os efeitos da Lei nº 10.628/02, não gera efeito vinculante, por tratar-se de decisão isolada do relator, sujeita ainda à decisão definitiva do Pleno do STF. Assim sendo, é de se adotar o posicionamento dos Tribunais Superiores e do Supremo, no sentido de que a prerrogativa de foro restringe-se aos processos criminais, o que não representa o caso dos autos.
4) Negado provimento ao recurso. (fls. 47/78)

De outra banda, dimanou, mais tarde, já em fase de Recurso Especial (Resp 604832-ES), em parecer ofertado pela DD. Procuradoria-Geral da República, ementa mui semelhante ao entendimento acima expendido se engendrou, nestas palavras:
EMENTA. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DEPUTADO ESTADUAL. AFASTAMENTO. INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
1. O instituto do afastamento do cargo ou função previsto na Lei 8.429/92 pode ser utilizado em toda a fase da instrução processual.
2. Identificada a real possibilidade de que agentes políticos, aproveitando-se de seus cargos, embaracem a apuração de fatos gravíssimos descritos em ação de improbidade, tal fato justifica a manutenção do afastamento. Há que prevalecer o interesse público em ver devidamente apurado atos que importam em lesão patrimonial ao erário, bem como aos princípios administrativos da moralidade e legalidade
3. É possível a interrupção do afastamento do agente político para instrução processual quando cessadas as causas ensejadoras da medida cautelar.
4. Pelo improvimento do recurso especial.

Destarte, não o que se debater quanto à possibilidade jurídica da adoção da medida ora pleiteada, nem tampouco deixar de perceber que a destituição da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa é medida que se impõe, gozando o referido pleito de sustentação popular já que o mesmo vem lavrado por diversas entidades da sociedade civil.

2.2 Da Proteção ao Estado Democrático de Direito.
Os fatos trazidos à baila na Operação Taturana desvelam um grande ferida presente não em nosso Estado, mas também em todo o País. Referimo-nos à corrupção, que tem solapado a esperança de assistirmos à construção de um Brasil menos injusto. É que as somas vultosas que somem do erário público pela prática da corrupção é um óbice quase intransponível ao investimento em setores como educação, saúde, ciência, tecnologia etc.
Exatamente nessa medida, a corrupção, juntamente com a concentração de riquezas e a insensibilidade de nossas classes dominantes, são instrumentos que ajudam a tornar inexeqüível o principal desiderato do Estado Democrático de Direito engendrado em nossa Carta Política de 1988, a saber: “ [...] um Estado humanista de fundo igualitário, que supõe a superação de conflitos [...]”[2].
Ora, Vossa Excelência, o desenlace da Operação Taturana interessa á sociedade alagoana. Noutras palavras, a responsabilização civil e criminal dos que desviaram milhões de reais dos cofres públicos é deve ser o elemento norteador da ação desse Parquet e uma bandeira de luta das entidades que formam a sociedade civil.
Destarte, pugnar pala marcha sem sobressaltos e interferências externas do inquérito policial e, mais tarde, da ação penal, é rechaçar a corrupção e, em primeiríssima análise, salvaguardar o Estado Democrático de Direito.


D O P E D I D O

Diante do exposto, considerando que as entidades subscritoras desta representam significativa parcela de nossa população que não tolera mais o ambiente de impunidade que sempre cercou os ilícitos cometidos por nossas elites, é a presente para requerer ao Ministério Público Federal sejam tomadas as providências cabíveis ao imediato afastamento de toda Mesa Diretora da Assembléia Legislativa.


Neste termos,
Pede Deferimento.

Maceió, 08 de janeiro de 2008.


Sindicato dos Policiais Federais de Alagoas (SINPOFAL)
Sindicato dos Policiais Rodoviários (SINDPRF)
Sindicato dos Servidores do Judiciário Federal e MPU (SINDJUS),
Sindicato dos Urbanitários,
Sindicato dos Trabalhadores em Seguridade Social (SINDPREV),
Sindicato dos Servidores Públicos de São Miguel dos Campos (SIMESC).
Sindicato dos Médicos
Sindicato dos Taxistas
Central Única dos Trabalhadores (CUT)
Marcha Mundial das Mulheres.
Sindicato dos Trabalhadores em Educação (SINTEAL).
Ordem de Advogado do Brasil - AL
[1] SALTZ, Alexandre Sikinowiski Saltz. In Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul. 1995, p. 250.
[2] SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2005.

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